domingo, 12 de fevereiro de 2012


Processo de aprendizagem: entraves e possibilidades
Profa. Rosa Maria Cavalcanti Brito

Processo de Aprendizagem: entraves e possibilidades

Muito se tem falado na qualidade da aprendizagem. E, em termos de quantidade, como ela caminha? Se desde bebês passamos paulatinamente por vários estágios que determinam o desenvolvimento da nossa inteligência (estudo realizado por Piaget) e se as nossas estruturas mentais são construídas para que possamos aprender, o que faz com que essa aprendizagem emperre? Ou mesmo com que ela não ocorra? Por que, às vezes, o aprender exige tanto do aluno, e o ato de ensinar, do professor?

O que bloqueia a aprendizagem?

Ao se analisar o que está por trás das dificuldades de aprendizagem, percebe-se que as crenças e atitudes do passado têm influência direta no impedimento do ato de aprender, uma vez que, desde a infância, o indivíduo é bombardeado pelo que o cerca, com palavras de ordem que ditam como agir, que determinam a capacidade ou incapacidade. Aprende-se inicialmente por imitação, reproduzindo atos e atitudes dos pais e de pessoas do entorno cotidiano, que marcam e influenciam a maneira de pensar, de agir, desenhando nossa personalidade. E, segundo Hunt (2000), “Muitas vezes, essa programação consciente e inconsciente foi contraproducente, limitando a percepção de nós mesmos e de nossas capacidades. Tais percepções limitadas nos deixam deficientes, se não totalmente incapacitados, em nossa habilidade operativa de aprender”.

O entrave das crenças

O amor-próprio e a autoconfiança são ferramentas indispensáveis para o sucesso do processo de aprendizagem em todas as etapas da vida escolar. Se, em alguma etapa, houver comprometimento dessas ferramentas por uma atitude negativa de alguém que participe do processo de aprendizagem e esse amor-próprio for ferido e a autoconfiança, abalada, o interesse pela aprendizagem ficará comprometido, e o aprender a aprender da Era da Informática e da Informação — tão enfatizado como principal aptidão do século XXI — trará para o aluno o receio de fracassar, gerando medos ocultos e pensamentos de inaptidão não confessos publicamente, mas que são um empecilho para o aprendizado.

As crenças dão forma às experiências

A história de vida molda as experiências do ser humano. Se ele pensa pequeno, terá coisas pequenas, limitadas; se pensa grande, terá coisas grandes, já que a capacidade humana é ilimitada. Portanto, precisa-se deixar para trás as crenças adquiridas no passado e deixar espaço para crenças positivas, dando nova roupagem e novo formato às experiências. Aplicando esse pensamento no campo da aprendizagem, ter-se-ão respostas positivas.

Os entraves do medo

O primeiro entrave é o medo de fracassar ou “o medo que paralisa”, que imobiliza, e o fracasso é associado ao falhar como pessoa humana. O medo deixa o indivíduo encolhido, pequeno, caminhando para o lado oposto da vida, que é energia, expansão. A solução para vencer o medo é agir de forma determinada, deixando a energia da vida fluir; iniciar um projeto e vivenciar todas as etapas até o final, analisando os pontos positivos e negativos, aprendendo com os insucessos; e, gradativamente, após atingir pequenas metas, partir para metas maiores.

O segundo entrave é o medo de ter sucesso, que caminha lado a lado com o medo de fracassar, sendo movido pelo orgulho pelos resultados conquistados. Ter medo do verdadeiro sucesso, passando a não poder ter um insucesso futuro do qual seria responsável. Esse comportamento faz com que o indivíduo caminhe em várias direções, desperdiçando energia para, ao final, se justificar dizendo que não teve tempo de completar aquela ou aquelas atividades. Precisa-se atribuir, à vida, os sucessos e permitir que ela se utilize do ser humano como o seu fio condutor.

O terceiro entrave é o medo de ser diferente. Apesar de existirem bilhões de seres humanos no planeta, nenhuma impressão digital ou íris do olho é igual à outra. Todos são ímpares na humanidade. Esse medo é alimentado pela conformidade e pela pressão exercida pelos semelhantes em detrimento da individualidade, inclusive em relação a costumes e atitudes. É preciso comemorar as diferenças, já que é monótono um quadro que retrate a imagem de todos com uma mesma cor, anatomia idêntica, fisionomias iguais. Todo indivíduo é único, por isso devem ser valorizadas as diferenças, fazendo cada um a própria trajetória, o seu projeto de vida.
Por último, o medo da mudança — no qual tudo que é confortável se torna hábito, aqui incluídas as modalidades de pensamento e de comportamento —, que conduz o ser humano ao medo da mudança ou ao medo de sair da nossa Zona de Conforto, contribuindo para a produção estanque de paradigmas.

E o que seria essa Zona de Conforto?

É a área de segurança. É nela que o indivíduo se sente firme, com os pés no chão. É lá que estão catalogados antigos hábitos e tudo o que se conhece. Aquele planejamento de dez anos atrás é o “conforto”. Se for dado um passo fora da Zona de Conforto, sente-se aflição, ansiedade, insegurança e medo. Medo do novo, do desconhecido. E o processo de aprendizagem, aliado ao de crescimento, transita na área do desconhecido, do novo, portanto fora da Zona de Conforto, gerando emoções confusas, desconforto e medo.

O processo de aprendizagem, de crescimento e de mudança deve ser parte integrante e contínua da vida, e, para tanto, deve-se compreender suas cinco fases para que não haja surpresa quando elas surgirem.

A primeira fase é a da rejeição, fase em que se nega a necessidade da mudança. A tendência é manter o sistema em repouso e deixar do jeito que está sem ver necessidade de mudar. “Vem dando certo há tanto tempo”, isso para justificar a maneira de agir e julgar o outro que apresenta um novo caminho, uma nova prática ou, ainda, uma nova possibilidade.

A segunda fase é a da aceitação, caracterizada pela aceitação do processo de mudança. As novas idéias estão incubadas e não têm tempo determinado para aflorar, podendo esse processo ser rápido ou levar meses. Passa-se a encarar a mudança de forma positiva, considerando a nova possibilidade.

A terceira fase é a da volição, a vontade de mudar é pessoal e interior; a mente e o coração desejam essa mudança. O consentir é o passaporte para o aprendizado ou o crescimento.

A quarta fase é a da decisão, é o convite da voz interior: é a hora de mudar, passar da decisão para a ação e caminhar na direção do objetivo a que se propôs.

A quinta fase é a da ação. Nessa hora, é preciso ter em mente que é necessário sair, de forma gradual, da Zona de Conforto, tendo em vista que uma saída abrupta pode desequilibrar o sistema vivo, inclusive o sistema de hábitos, pois é quando se percebe quão internalizados os velhos hábitos estão. Para tanto, não se deve operar uma transformação radical, para dar tempo ao sistema de se reequilibrar no período do processo de mudança.

Segundo Hunt (2000), “A quantidade de resistência à mudança é igual à distância que nos separa de nossa Zona de Conforto, somada à velocidade com que introduzimos a mudança — ou seja, o quanto e com que rapidez nos afastamos do que nos é familiar”. Quando as pessoas tentam sair rapidamente de sua Zona de Conforto, não conseguem sustentar a mudança porque criam uma grande resistência, desistindo e voltando ao que é conhecido e seguro. Exemplo disso é o professor que há muito está afastado de grupos de estudo ou de leitura e, embora tenha consciência de que é preciso correr atrás, como muitos estão fazendo, tem medo de fracassar no seu propósito. De repente, compra uma série de livros, marca com os colegas que estudam em grupo, organiza um horário extenso de leitura para si, processo já vivenciado anteriormente, e, no primeiro dia, não cumpre o cronograma estabelecido. Recomeça no segundo, no terceiro e, nos dias subseqüentes, desiste. Esse é um processo de transformação radical.

Agora uma amostra com resultado positivo num processo de transformação gradual. Um aluno de 12 anos sonhava em aprender a nadar. Passava tardes olhando os colegas na aula de natação ou os que estavam treinando, pois faziam parte da equipe de natação da escola. Ele sentava ao lado da piscina, mas não conseguia entrar na água, pois tinha medo (Fase 1 – Rejeição). Aos poucos, sentou na borda da piscina. Dias depois, conseguiu colocar os pés na água e passou a batê-los. Aos poucos, ia aceitando a idéia de entrar na piscina (Fase 2 – Aceitação) e até mesmo desejando ter coragem para entrar na piscina (Fase 3 – Volição). Depois, pensou com seus botões: “Se eles podem entrar na piscina, eu também consigo” (Fase 4 – Decisão). Pediu à mãe para comprar os óculos de piscina e a touca (Início da fase 5 – Ação).

Todos os dias, levava a touca e os óculos, mas continuava sentado na borda da piscina a bater os pés. Depois, colocou os óculos e a touca, mas não entrou. Dias depois, após colocar o material, chamou o professor e pediu ajuda para entrar na água. Entrou e, a partir daquele dia, estava na piscina em todas as aulas, aprendeu a nadar e passou, após muito treino, a fazer parte da equipe de natação da escola (Fim da Fase 5 – Ação).

Para objetivos de longo prazo que se encontram distantes da Zona de Conforto, é mister que o processo se dê de forma gradual, passo a passo, de maneira que gere conforto, possibilitando a aquisição de comportamentos novos e ampliando a Zona de Conforto.

Bloqueios de atitude

Estudos realizados em universidades americanas nos anos 1980 dão conta de que a grande barreira contraposta a qualquer tipo de comunicação é a opinião preconcebida que está respaldada nas atitudes, suposições, opiniões e expectativas.

Pesquisa recente das funções do cérebro aponta o motivo que leva a opinião preconcebida a ser tão prejudicial ao processo de aprender. O Sistema de Ativação Reticular — conhecido pela sigla RAS — é um feixe de fibras nervosas com o tamanho aproximado da ponta de um dedo e localiza-se na base do cérebro. Tem como função regular e filtrar as informações sensoriais captadas e evitar uma sobrecarga sensorial em um dado momento. O RAS tem duas funções específicas. A primeira é controlar o nível da informação recebida; a segunda é guiar a nossa atenção, permitindo a entrada do que é julgado importante e bloqueando o que não interessa naquele momento.

É o RAS que faz com que as mães percebam uma alteração da respiração do filho durante a noite, permite a concentração em uma determinada tarefa, ignorando o que é estranho à finalidade.

As crianças com RAS deficiente não se concentram em uma coisa de cada vez e são bombardeadas por imagens, sons e sensações do seu entorno. Sem a concentração da atenção no tempo correto e suficiente, elas não escutam o que pais e professores lhes dizem. O defeito do RAS é tão grave que, até pouco tempo, as crianças com RAS deficiente foram julgadas mentalmente perturbadas. Porém, com a pesquisa cerebral recente, identificou-se que era apenas um fenômeno físico, e não mental, obedecendo às decisões tomadas pela pessoa que habita o traje corporal.

Por exemplo, um professor de Língua Portuguesa que a escola enviou para um seminário objeto do seu desejo e um outro professor da mesma disciplina, mas que não desejava estar naquele seminário. Os dois passaram o dia participando da mesma atividade lado a lado, ouvindo o mesmo conteúdo pelo mesmo instrutor. Ao final do dia, o que não desejava estar lá vai embora alegando perda de tempo porque o ambiente não era propenso e que o instrutor não tinha o dom da oratória, o assunto não interessava. O outro sente-se totalmente satisfeito, tudo foi maravilhoso, atendeu a todas as suas expectativas em todas as categorias. Por que a diferença de atitude se o evento era o mesmo? Porque a diferença estava na inclinação do RAS de cada um deles.

Um RAS foi informado de que o professor desejava estar naquele seminário e de que o outro, dono e operador do traje corporal, não desejava estar lá. Aqui, os dispositivos de filtragem cerebral, o que controla o nível da informação e o que dirige a nossa atenção, atuam durante todo o dia demonstrando que o indivíduo que operava o traje corporal estava correto no seu pressuposto.

Fica claro o prejuízo no processo de aprendizagem decorrente da opinião preconcebida: o cérebro faz a filtragem, descarta tudo o que vai de encontro à opinião e permite a passagem de tudo o que confirma. Já foi dito que o aluno sabe pouco e descobre muito. Deve-se levar a vida como alunos, não querer ser só especialistas, permitir à mente esvaziar-se do que é preconcebido e ser aberto e receptivo ao que a vida oferece a cada momento.

Rompendo nossos entraves

É imperativo reconhecer que as atitudes mentais estão intimamente relacionadas com a condição e capacidade de aprender. O corpo tem a função natural do aprendizado, mas ela é prejudicada em função da educação recebida e do que é internalizado em relação às opiniões e atitudes dos outros. Para tanto, faz-se necessário que seja desprogramado o que está deficiente e se eleja um arsenal de condições interiores aptas a receberem coisas positivas.

Para cada obstáculo ou barreira, existe solução; para cada aspecto negativo, existe o positivo; para o desânimo, existe o ânimo; e, para a aprendizagem, existe a ensinagem. Não se deve esquecer que os desacertos com o processo de aprender estão diretamente ligados aos medos, às crenças e às atitudes. Portanto, urge a mudança da maneira de pensar, de agir, saindo gradualmente da Zona de Conforto, na aventura deliciosa que é o terreno do aprendizado. Escalar a montanha do medo, atravessar o rio das crenças e colocar as atitudes no primeiro lugar do pódio, ganhando a corrida, vencendo os entraves e as barreiras e levando, como prêmio, a conquista do aprendizado.

Bibliografia
HUNT, Trinidad. Aprendendo a aprender. Rio de Janeiro: Record: Nova Era, 2000. 
Profa. Rosa Maria Cavalcanti Brito
Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA
Coordenadora do Colégio Diocesano Cardeal Arcoverde/PE


fonte: http://www.construirnoticias.com.br/asp/materia.asp?id=1263

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